quarta-feira, 13 de fevereiro de 2013

Biografia: Caciano Ricardo

https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg_tdIjI7Blxv-ygcUwNIUgShvjKAZBnKALp26ZyjZiNnneFF0YP9K_10PRIWiAzsbzXBh6-KQK9pnjhPJBgocdSYMv7NFGtqPeOmWgRQdLmaOGO8kG37W3NNfpN95TpM5G4Gt8HisFhls/s320/Menotti%2520del%2520Picchia.jpgCassiano Ricardo Leite (São José dos Campos SP 1895 - Rio de Janeiro RJ 1974). Poeta, ensaísta e jornalista. Passa a infância na pequena propriedade rural da família, realizando os estudos primários em sua cidade natal, e o ginásio, em Jacareí. Por influência da mãe, escreve seus primeiros versos ainda na escola. Passa a viver na capital paulista em 1915, quando ingressa na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco - que concluirá no Rio de Janeiro. Estreia em livro em 1915, com os poemas de Dentro da Noite, e, em 1917, lança A Frauta de Pan. Este último recebe elogios dos paranasianos Olavo Bilac (1865 - 1918) e Alberto de Oliveira (1857 - 1937). Atua como advogado inicialmente em São Paulo, e, de 1920 a 1923, no Rio Grande do Sul. De volta à capital paulista, integra o grupo dissidente da Semana de Arte Moderna, organizando os grupos Anta e Verde-Amarelo, com os escritores Menotti del Picchia (1892 - 1988), Plínio Salgado (1895 - 1975), e Raul Bopp (1898 - 1984). O nacionalismo dessa fase terá seu ápice nos poemas de Martim Cererê (1928). Abandona a advocacia e entra para o funcionalismo público, ocupando cargos diversos: inicialmente o de censor, e em 1932, o de secretário do interventor paulista Pedro de Toledo, sendo preso por dois meses por apoiar a Revolução Constitucionalista. É eleito para a Academia Brasileira de Letras, em 1937. Dirige, de 1940 a 1945, o órgão oficial A Manhã, em que cria o suplemento Autores e Livros e partir do qual se torna um dos principais ideólogos do Estado Novo. Conforme o ensaio Marcha para o Oeste, de 1940, suas ideias ultranacionalistas apostam na figura do bandeirante como introdutora do sentimento nacional e representante da possibilidade de ascensão social. Em 1943, após 12 anos de silêncio poético, lança O Sangue das Horas, considerado o início de sua terceira fase, metafísica. De 1953 a 1955, permanece na Europa, como diretor do Escritório Comercial brasileiro em Paris. Publica, em 1964, Jeremias Sem-Chorar e, em 1971, Os Sobreviventes, incorporando procedimentos da vanguarda concretista.



Comentário crítico

A longa e produtiva carreira poética de Cassiano Ricardo - dezenove títulos de inéditos entre 1915 e 1971 - reflete a história da literatura de seu tempo: tendo se lançado com versos de fundo parnasiano, cultiva o modernismo verde-amarelo, a partir de 1926, passando a um lirismo reflexivo, ao fim dos anos 1940, e à proximidade com as experiências de vanguarda, na década de 1960. A despeito, entretanto, do que possa sugerir a identificação de fases em sua trajetória, esta obra apresenta intensa unidade, no que diz respeito tanto aos temas aos quais se dedica o poeta quanto à ideologia que define o posicionamento do autor.



A comparação entre três poemas de temática semelhante ilustra a evolução sem rupturas de Cassiano Ricardo. O soneto "Marcha Fúnebre", de Dentro da Noite (1915), livro de estreia, retrata um eu lírico que, ao ouvir a melodia lúgubre, passa a se questionar a respeito da passagem do tempo. A interrogação surge, conforme narrado, na segunda quadra: "A saudade, a amargura, a dúvida, a agonia/ irrompem dentro em mim, num brusco desenlace,/ e entre a dor que me fere e o som que me extasia/ uma ideia, em meu ser contraditório, nasce", e levará o sujeito a concluir, no verso final: "lá vou eu conduzindo o enterro de mim mesmo". O trecho evidencia a proximidade com a dicção parnasiana, a partir de elementos como a sintaxe rigorosa, o vocabulário culto, a nomeação dos quatro sentimentos no primeiro verso e a autonomia conferida a uma "ideia" que "nasce" no "ser".



Já em "Percurso", de Jeremias Sem-Chorar (1964), o poeta retomará a mesma preocupação, mas com significativas diferenças estéticas: "Mas o tempo/ ponte que cresceu/ entre mim e eu./ E por onde vim.// No enterro/ de cada minuto,/ pergunto:/ quem morreu/ em mim?". A metáfora do enterro que encerrava o soneto de 1915 torna-se mais concisa, intensificando a tópica da passagem do tempo. Os versos dodecassílabos dão lugar aos livres, de ritmo leve e ligeiro. Já não há, ademais, o encerramento do conflito em uma metáfora, permanecendo a suspensão.

Entre um e outro, haverá também os versos longos, porém livres, deste poema de João Torto e a Fábula (1956): "Um dia conversarei com os meus mortos/ E todos os que morri (os muitos eus que fui)/ reunidos inquietos sôfregos cada qual com um meu rosto na mão/ me contarão (sua) a minha história". No excerto, o retrato da fragmentação do eu traz ainda a elevação conferida à problemática existencial.



O recurso adotado no soneto "Marcha Fúnebre", de 1915, retornará em "Café Expresso", um dos mais conhecidos poemas de Martim Cererê (1928), livro considerado o ápice da fase modernista de Cassiano Ricardo. Também aqui um elemento sensitivo desperta o insight no sujeito poético: "A minha xícara de café/ é o resumo de todas as coisas que vi na fazendo e me vêm à memória apagada". Neste caso, porém, trata-se de um produto nacional - o café -, e o foco não está apenas na passagem do tempo, mas no contraponto entre o homem adulto, habitante de uma São Paulo acelerada e industrializada, e o menino crescido no campo.



De acordo com Luiza Franco Moreira, a relação entre presente urbano e passado rural está no centro da estrutura do livro de 1928, compondo o "emparelhamento contraditório de menino e adulto" que exprimirá a tese política do autor. Pois o mito da identidade brasileira criado em Martim Cererê conjuga episódios históricos e elementos do folclore em uma construção que, equiparando as expedições bandeirantes ao ciclo de exploração do café, coloca a metrópole paulista como o destino da nação - de maneira a subordinar toda a população à pequena parcela privilegiada da cidade. O menino Martim Cererê, saci oferecido como alegoria do Brasil, revela, nesse sentido, a inclinação paternalista e autoritária da obra: o país, como menino ao mesmo tempo encantador e imaturo, mereceria afeto e careceria de orientação.



A mesma tese, embora em chave não literária, é o fundamento do ensaio Marcha para o Oeste (1940), em que a visão positiva sobre a miscigenação se soma à crença no pioneirismo das Bandeiras, resultando na "concepção do Estado forte como fruto de nossa esvolução histórica", conforme afirma Antonio Candido (1918). A preocupação com um programa essencialmente nacional é patente também nos ensaios sobre literatura escritos por Cassiano Ricardo. A defesa de uma postura participativa por parte do intelectual formula-se, nesses textos, como uma busca pelo que há de propriamente brasileiro.



Não à toa, Martim Cererê foi adotado em escolas, e Cassiano Ricardo aproximou-se ao Estado Novo, servindo ao projeto de Getúlio de Vargas. Por essa razão e a despeito das composições em que demonstra perfeita consciência dos recursos poéticos, "para o [seu] público contemporâneo, Cassiano é o poeta de Martim Cererê; para os críticos, um escritor modernista de importância histórica, e para os historiadores, um ideólogo estadonovista", segundo resume Moreira.

Dados extraídos do site: www.itaucultural.org

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